O "Não é não!" e a naturalização do "namoro" infantil

No dia Internacional da Mulher deste ano, eu participei de uma manifestação no centro do Rio de Janeiro para gritar a sociedade que não vamos aceitar sermos mortas diariamente. Eu fui sozinha na manifestação por questões de logística do dia mas queria muito ter levado minha filha mais velha. Quando cheguei em casa, eu conversei com ela sobre a manifestação e mostrei um vídeo onde ela podia ver várias mulheres gritando : "Não é não!"

E esse “Não é não!” é um dos pontos básicos para falar da luta das mulheres. Simplesmente porque nosso “não” é lido com várias interpretações menos com a verdadeira intenção. Não é sempre uma negativa, não é bem óbvio?

Já vimos revistas voltadas pra adolescentes, memes na internet e pessoas no dia a dia compartilhando da opinião que mulheres falam NÃO mas querem na verdade, falar outra coisa. 

Não existe isso, amigo! 
Não é sempre não. 
Não, não é sim. 
Não, não é talvez. 
Não, não é se “fazer de difícil”.

Meme da internet achado facilmente em site de busca

Dessas diversas interpretações que se entendem para um NÃO falado por uma mulher no bar, na noitada, surgem casos de violência, de assédio sexual e de estupro. Nenhum outro NÃO ganha tantos “se” como um NÃO dito por uma mulher.

E por que estou falando sobre minha filha e sobre o NÃO de mulheres?
Bem, minha filha é uma menina, que recém iniciou sua jornada no ensino fundamental. Em meio a tudo isso, desde o ultimo ano do ensino infantil, ela relata várias situações entre os colegas chamadas de “namoro”. Eu sempre conversei muito com ela que namoro não é para crianças, que colegas são amigos e que tudo tem seu momento na vida.

Um certo dia, ela relatou um “pedido de namoro” de um coleguinha que ela prontamente respondeu NÃO. Maria sempre entendeu que crianças não namoram. A grande questão é que houve insistência, houve abraços melosos. Tudo isso que ela me contou me levou a refletir e conversar sobre o respeito ao "Não" feminino.

Você diria: Ah mas é só uma criança!

Sim, é só uma criança. Uma criança que como a grande maioria recebe um estímulo enorme da sociedade, pais, familiares para namorar outra criança.
“São namoradinhos?”
“Fulano, essa menina é sua namorada?”
“Meu filho é pegador! Garoto esperto vai levar a mulherada a loucura”
“Cuidado, que meu filho tá chegando!”
São frases como essas que estamos falando para nossos meninos, nossas crianças, que vão crescer e se tornarem homens que não vão aceitar ouvir um NÃO de uma mulher, que vão seguir com esse ciclo. Crianças que se sentem incentivadas a namorar e que inclusive, se sentem excluídas quando não namoram e vêem isso de forma tão naturalizada no meio infantil.

Mais do que ensinar a minha filha sobre a importância do seu NÃO e de como ele precisa ser ouvido e respeitado hoje e no futuro, a reflexão é imprescindível.
A nossa fala, como pais e educadores, tem que mostrar aos nossos meninos que o “não” de uma menina não é sinônimo de “sim” ou “talvez”;
Temos que internalizar de vez que namoro não combina com infância e que menina nenhum precisa ter “cuidado” com um menino se aproximando.

Só a educação e o exemplo são capazes de quebrar ciclos. De criar homens respeitosos e mulheres seguras. Pra que quando a minha menina vire uma mulher, ela tenha certeza que seu NÃO será claramente entendido e respeitado.

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