As crianças e o discurso mais falso do mundo: SOMOS TODOS IGUAIS

Sempre que alguém relata pessoalmente ou em redes sociais sobre preconceito ou racismo envolvendo crianças, surge a frase mágica: "Eu ensino meus filhos que todos somos iguais". Particularmente, eu fico imaginando os responsáveis pelas crianças repetindo sem parar que "somos iguais" se a situação é bem obvia. NÃO SOMOS IGUAIS!

Recentemente na lição de Geografia da minha filha mais velha tinha toda uma unidade destacada para falar sobre a diferença e diversidade das pessoas. Enquanto isso, os adultos continuam batendo numa tecla que é complemente irreal. Sim, eu sei que eles estão se referindo ao tratamento respeitoso. Entretanto, devemos considerar que nem isso é verdade. Porque as pessoas não são tratadas de forma igual. Existe o tal privilégio dentro da sociedade, que são "normativas" não escritas de como a sociedade lê e reage aos indivíduos.

Nós somos tão mas tão diferentes que nem gêmeos univitelinos são cópias. A questão é que socialmente, as crianças (e adultos) partilham de ambientes e espaços que são predominantes de pessoas "iguais". Todos da mesma cor de pele! Todos com condições financeiras similares! Todos com configurações familiares parecidas! Então, não é de se estranhar que o IGUAL se encaixe no dia a dia de tantas crianças. 

Quando a gente reforça o "somos todos iguais", as crianças vão percebendo as diferenças entre elas. Cor de pele, corpos diversos, características físicas. Somos capazes de chamar um lápis róseo de "cor da pele" na frente de uma criança negra. Somos capazes de usar termos como "cabelo ruim" e "cabelo difícil" perto de meninas com cabelos crespos e cacheados. Somos capazes de odiar nossos corpos, puxar uma micro barriga pra falar horrores de nós mesmas diante de nossas filhas... "enorme", "horrível". Somos capazes de incluirmos crianças em dietas logo cedo. Somos capazes de usar termos que reduzem ou relacionados a pena com pessoas com deficiência diante dos nossos filhos assim como, usamos termos racistas. Somos capazes de fazer piadas de "loira burra", negro, gordo e gays numa roda de amigos e num almoço familiar diante de crianças de todas as idades. No fim do dia, somos capazes de falar: SOMOS TODOS IGUAIS.

Quando a criança replica o comportamento, a gente se assusta. A gente trata como "é coisa de criança", como se criança fosse um ser puro, angelical, incapaz de reproduzir violência. Como eu falei de privilégio lá em cima do texto, quanto maior o privilégio e menor a representatividade, mais fácil é reproduzir esses discursos preconceituosos e racistas.

Por que falamos tanto de representatividade? Porque é essencial ver o personagem famoso, o ator/a atriz na novela/filme, os coleguinhas da escola, o médico do hospital, os brinquedos da moda com a "sua cara". Se ver é ver possibilidades. Ver o outro é aprender a viver com as diferenças. Representatividade permite crescer sabendo que somos todos diferentes. Que a gente crescendo assumindo nossos privilégios, respeitando os lugares de fala, lutando por um mundo mais justo para todos, possamos ter uma geração no futuro em que uma criança saiba ver, ouvir, lidar e incluir outra criança que seja diferente dela. O "SOMOS TODOS IGUAIS" não incluí e não representa ninguém.




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