Deixem nosso útero livre! - É preciso falar sobre aborto.

Milhares de argentinas foram as ruas pressionar e pedir o aborto seguro. No dia 14/06/2018, a câmara de deputados da Argentina aprovou em votação histórica o projeto de lei que descriminaliza o aborto. Obviamente, notícia extremamente comemorada por lá e por aqui, aonde o aborto ainda é crime. Ver nossas hermanas caminhando para a vitória de decidirem por seus próprios corpos nos anima e nos dá esperança que um dia teremos essa realidade no Brasil.

Em 2017, estimava-se 55,7 milhões de abortos são feitos por ano no mundo sendo 97% desse número considerado em países em desenvolvimento, aonde a maioria esmagadora considera aborto ilegal*. A Pesquisa Nacional do Aborto 2016, financiada pelo Ministério da Saúde, demonstrou que uma em cada cinco mulheres aos 40 anos já fez, pelo menos, um aborto. Em 2015 foram meio milhão de abortos**. Fora que esses números provavelmente são maiores tendo em vista que é difícil quantificar pela questão da ilegalidade.  E por que estou enchendo esse texto de estatísticas?

Porque indiferente do que você acha, do que o estado acha, do que o amigo acha, mulheres abortam. Sua vizinha, sua tia, sua avó, sua professora, sua mãe, sua prima, sua amiga, sua colega do trabalho. A ilegalidade não impede abortos. A ilegalidade leva a morte. E a morte tem cor e condição financeira. Mata especialmente as negras e as pobres. Porque quem tem dinheiro, faz um aborto com segurança. A descriminalização que impedir que mulheres como Caroline, Jandira*** e tantas outras morram em clínicas ou nas mãos de curiosas. Abandonadas pelo estado e "assassinas" pela sociedade.

Ninguém está livre de uma gravidez indesejada. Nenhum método contraceptivo é 100% eficaz. Falando em Brasil, a educação sexual ainda é tabu e tantas pessoas acham que ela nem deveria ser mencionada em escola. Falar cada vez mais em prevenção é essencial. Trazer os homens e meninos para se responsabilizarem pelo ato sexual é imprescindível. Entretanto, a partir do momento que você transa, você pode engravidar. 

Eu vejo muitas pessoas com objetivo de demonstrar que ter um filho é uma decisão que impacta diretamente a vida das mulheres, comparando aborto com abandono paterno. Considerando que 5,5 milhões de crianças não tem o nome do pai na certidão e que outras milhões sofrem de abandono do pai, é extremamente injusto comparar aborto com abandono. Abandono estamos falando de uma criança. Alguém que nasceu, que precisa comer, morar em algum lugar, ter saúde, educação e afeto. Esse abandono é cruel. Um abandono que sobrecarrega as mães e que a sociedade patriarcal fecha os olhos, os ouvidos e passa a mão na cabeça dos homens pseudo pais por aí. O aborto é indicado até 14 semanas quando ainda é uma embrião. Tem vida? Depende de como cada um define vida. É um presente de Deus? Se você acreditar em Deus. Aborto fala muito mais das nossas crenças religiosas e da nossa criação machista do que da realidade. Um aborto seguro é um direito das mulheres. Cada uma deve decidir se fará um ou não. As convicções do outro não podem legislar o meu útero. Acha que aborto é um absurdo? Não faça um. 

Estamos junto as hermanas da Argentina aguardando a aprovação da descriminalização no senado. Vamos pra rua e pressionar por aqui também. Não nos calarão! Nenhuma a menos! A América Latina vai ser toda feminista.




* https://oglobo.globo.com/sociedade/quase-metade-dos-557-milhoes-de-abortos-anuais-feitos-no-mundo-sao-inseguros-21879575
** https://www.cartacapital.com.br/sociedade/aborto-a-cada-minuto-uma-mulher-faz-um-aborto-no-brasil
*** http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/09/mulher-morreu-de-hemorragia-interna-apos-aborto-diz-laudo-da-policia.html

Comentários

Postagens mais visitadas